Doença periodontal e diabetes

Doença periodontal e diabetes

O desconhecimento dos problemas inerentes ao diabetes faz com que os cirurgiões-dentistas tenham certo preconceito em promover tratamentos periodontais em pacientes acometidos pela doença.

 
Um dos erros mais comuns é pensar que pacientes diabéticos têm maior probabilidade para o desenvolvimento de hemorragias pós-operatórias, por exemplo.
 
O fato é que o paciente diabético pode ser considerado como um grande coagulador espontâneo ou mesmo um “coágulo humano”, pois a glicose é esclerosante e tóxica.
 
Os diabéticos têm dificuldade na cicatrização devido à falta de nutrição terminal e eventos colagenolíticos, além da já citada ação esclerosante da glicose, que é altamente tóxica nos vasos e acaba lesando os mesmos de forma irreversível, haja vista que a glicose também é utilizada para secar pequenos vasos em varizes nas pernas por meio de seu efeito esclerosante.
 
Diante disso, alguns profissionais de saúde e até cirurgiões-dentistas acreditam que é necessário pedir autorizações sem sentido e, muitas vezes errôneas, aos endocrinologistas quando se fala de tratamentos mais invasivos em pacientes diabéticos. Ora, quem sabe avaliar cada caso é o cirurgião-dentista, que pode e deve solicitar ao médico endocrinologista um relatório sobre a evolução e estado atual do quadro clínico do paciente, aí sim, para que ele avalie a conduta ideal frente à gravidade de cada caso.
 
Todo o tratamento em pacientes diabéticos deve ser feito com a utilização de antimicrobianos, para suprir sua dificuldade de cicatrização e para que o mesmo não venha a desenvolver uma infecção em função da facilitação causada pela doença diabetes.
 
O cirurgião-dentista deve ter em seu consultório um glucômetro ou glicômetro, que são aqueles aparelhos que mensuram a glicemia dos pacientes, através de uma leitura simples em uma tira de papel específico e que vêm com o kit. Para o odontólogo é muito fácil fazer essa leitura pelo sangramento gengival, através de uma gota de sangue necessária para esse exame, sem que haja o desconforto da perfuração digital para o examinado.
 
Um dos exames para a detecção da glicemia é a glicose no soro ou glicemia em jejum, que pelo método enzimático colorimétrico nos dá como valores de referência: normal de 75 a 99 mg/dL; pré-diabetes entre 100 a 125 mg/dL e é considerado diabetes mellitus igual ou superior a 126 mg/dL.
 
Outro exame importante é a hemoglobina glicada ou hemoglobina glicosilada ou glicohemoglobina ou A1C; que pelo método da cromatografia líquida de alta performance (HPLC) em coluna iônica, no sistema Variant II (Bio-Rad), tem como valor referência: de 4,0 a 6,0%. Teste mais fiel, pois está relacionado com a vida das hemácias, ou seja, que é em torno de 90 dias, portanto, os níveis de A1C refletem o controle glicêmico das últimas 12 semanas.
 
Recentemente, o termo Medicina Periodontal foi proposto para descrever um novo enfoque de evidências, baseadas em dados que cada vez mais sugerem que as infecções periodontais contribuem para a morbidade e mortalidade de certas condições sistêmicas, entre elas o diabetes mellitus (DM). A iminente necessidade de um estreitamento entre a Medicina e a Odontologia trouxe uma nova e positiva direção de esforços em busca de um envelhecimento saudável e com melhor qualidade de vida.
 
Basicamente, o diabetes mellitus é definido como uma tríade de sintomas: polidipsia, poliúria e polifagia, causada pela tolerância alterada à glicose ou mesmo por um metabolismo defeituoso de lipídeos e carboidratos, sendo a principal perturbação homeostática glicêmica, resultante tanto da baixa produção de insulina pelo pâncreas como também pela falta de resposta dos tecidos periféricos a ela. Entre as suas maiores complicações, estão: anormalidades microcirculatórias, nefropatias, neuropatias a cicatrização alterada, além da aterosclerose cerebrovascular, cardiovascular e de vasos periféricos.
 
Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam que 12 milhões de brasileiros são diabéticos.
 
Diabetes mellitus aumenta o risco de desenvolvimento e instalação das doenças periodontais? As doenças periodontais aumentam a gravidade e as complicações relacionadas com o diabetes? E vice-versa?
 
Pesquisas constataram que esse caminho DM x DP é sim uma via de mão-dupla, ou seja, bidirecional.
 
Diabetes – alteração vascular – alterações do fluido gengival sulcular e do tecido conjuntivo – resposta imunológica do hospedeiro – doença periodontal – liberação de citocinas pró-inflamatórias e proteínas da fase aguda – ação alterada de insulina – alteração metabólica.
 
Daí a importância em fazermos controles preventivos trimestrais em pacientes diabéticos, mais ainda se levarmos em consideração que seu controle metabólico é muito instável, podendo se alterar por uma simples situação de estresse cotidiano.
 
O tratamento periodontal, quando precedido da administração sistêmica de antimicrobianos, melhora o controle metabólico dos pacientes. A Doxiciclina contribui para a redução da profundidade de sondagem e redução no índice de Porphyromonas gingivalis em pacientes diabéticos comparados ao grupo controle, melhora também o controle metabólico do diabetes, por meio da redução da hemoglobina glicosada e das exigências de insulina. Outro estudo mostrou que a DP grave anda paralelamente ao DM grave e que o diabetes é um fator de risco para a DP grave, formando, assim, uma via de mão dupla.
 
Evidências comprovam que a eliminação da DP com o uso de antimicrobianos sistêmicos melhora o controle metabólico de diabéticos. A Academia Americana de Periodontologia propôs algumas recomendações para o tratamento de pacientes diabéticos: os procedimentos devem ser curtos e o mais livre de estresse possível. Os pacientes devem ser instruídos a tomarem suas medicações e continuar o controle da dieta, bem como o automonitoramento dos níveis glicêmicos durante o curso do tratamento dentário. Tomar normalmente o café da manhã, prevenindo a hipoglicemia. Sendo preferível o tratamento durante o início da manhã, devido aos níveis endógenos de corticosteróides estarem mais altos, sendo mais tolerados os procedimentos estressantes. Caso o procedimento seja longo e estressante, podemos lançar mão da sedação consciente, assim como a alteração do regime de insulina ou do hipoglicemiante via oral. Podem ser requeridas também supervisões médicas, com dieta especial.
 
Sugerimos a utilização de Doxiciclina 100mg, sendo a posologia indicada de uma drágea por dia, durante um tratamento breve de 30 dias, ou ainda, em casos mais graves, a utilização da associação de dois antimicrobianos o Metronidazol de 250 mg ou de 400 mg e a Amoxicilina de 500 mg, com a posologia de oito em oito horas, durante 10 dias ou enquanto for necessário, em função de cada caso. Já na profilaxia antimicrobiana para endocardites bacterianas é válida a posologia normalmente utilizada, que é a de 2g de Amoxicilina (quatro cápsulas de 500 mg) uma hora antes de qualquer intervenção cirúrgica ou de raspagem.
 
Conclusão
 
O conhecimento das manifestações sistêmicas e das reações celulares nos pacientes diabéticos traduz e confirma sua posição de grande importância complexo inter-relacionamento das especialidades médicas. É evidente que a doença diabetes agrava e modifica as doenças periodontais, assim como, nesta via de mão dupla, é correto afirmar que as doenças periodontais agravam e modificam o diabetes. É importante ressaltar que é condição sine qua non uma maior abrangência embasada em ciência na motivação consciente dos profissionais para o tratamento de pacientes diabéticos.
 
Eduardo Saba-Chujfi
Professor Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Periodontia do Centro de Pesquisas Odontológicas São Leopoldo Mandic, em Campinas, São Paulo.
 
 
Fonte: Odontomagazine – www.odontomagazine.com.br

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